Como o BNDES avalia seus projetos?

Uma metodologia para explicitar a contribuição do BNDES para o desenvolvimento

Há uma legitima e crescente demanda da sociedade por mais transparência nas ações das instituições públicas. No caso do BNDES, a demanda pode se traduzir na busca por maior acesso a informações, mas também por um melhor entendimento de como o Banco funciona e principalmente do que o diferencia de bancos comerciais. Este artigo pretende tratar desse segundo componente, já que primeiro – o acesso às informações – foi amplamente divulgado em recentes campanhas do Portal de Transparência, onde podem ser consultados os 50 maiores tomadores de crédito, todas as condições dos financiamentos realizados pelo BNDES desde 2002, além da íntegra dos contratos de exportação de serviços de engenharia para todos os países de destino e as informações da carteira de investimentos da BNDESPAR.

O processo de análise de projetos envolve basicamente dois componentes: análise jurídica e de risco de crédito e análise dos benefícios dos projetos apoiados para o desenvolvimento do país. Sobre o primeiro aspecto, esse é comum a todos os bancos e envolve análise cadastral e de certidões e metodologias de classificação de risco, chamadas de rating. Para não entrar na matemática e na complexidade desse tema, os resultados falam por si só: o BNDES tem uma taxa de inadimplência de 1,67%, inferior a taxa média do sistema bancário de 3,03%,1 e a qualidade da carteira de crédito (operações rating AA-C/total) também é superior à média.

Então o que de fato nos diferencia como banco de desenvolvimento é financiar investimentos produtivos, preferencialmente investimentos de longo prazo e prioritariamente investimentos que tragam impacto positivo sobre o desenvolvimento do país. A dificuldade está em medir o dito impacto. No momento da decisão de apoiar ou não um projeto, chamamos de avaliação de impacto “ex-ante” ou esperado e depois do investimento concretizado chamamos de avaliações de impacto “ex-post” ou efetividade (vide relatório de efetividade).

A metodologia da Tese de Impacto de Investimento em Projetos (Tiip) desenvolvida pelo BNDES busca avaliar os impactos esperados de um projeto de investimento no Banco em variáveis econômicas, sociais e ambientais. O desenvolvimento de um método como este é um desafio dada a diversidade de atuação do Banco. Uma pesquisa, projeto a projeto, na seção Transparência no site do BNDES é um bom indicativo sobre este desafio. O banco apoia grandes projetos de infraestrutura econômica (tais como logística, geração de energia eólica e distribuição de energia), infraestrutura social (tais como saneamento, hospitais e transporte urbano), meio ambiente (tais como eficiência energética, restauração florestal e controle do desmatamento) e inclusão social (tais como atividades de inclusão produtiva na Amazônia e no semiárido), dentre outros. Tem, como clientes, atores de diferentes naturezas e portes. No ano de 2018, 44,7% dos desembolsos e 96,7% das operações foram para micro, pequenas e médias empresas. O BNDES apoia empresas privadas com fins lucrativos, mas também organizações do terceiro setor. A necessidade de considerar essa diversidade de tipos de projetos, conjugada à variedade de perfis de clientes, demanda metodologias robustas e flexíveis de análise.

Da mesma forma, o financiamento ao desenvolvimento define per se o desafio de respeitar a sustentabilidade financeira da instituição e, simultaneamente, fomentar prioridades de desenvolvimento pré-definidas em suas distintas missões. A promoção do desenvolvimento é perseguida, em geral, por meio da viabilização de investimentos em ativos tangíveis e intangíveis, que transformem uma determinada realidade. Identificar aqueles ativos capazes de gerar essa transformação deve ser a rotina diária de um analista de projetos do BNDES. A elegibilidade e a priorização dos projetos de investimento deve, assim, ter por base a prudência bancária e a identificação de características e qualidades que os caracterizem como transformadores e portadores de benefícios de longo prazo para gerações de brasileiros.

O debate sobre o que é um projeto “transformador para sociedade” espelha claramente a diversidade da noção do desenvolvimento. Durante as comemorações de cinquenta anos das instituições de Bretton Woods, foi cunhado o termo “goal congestion”, identificando que as múltiplas missões das instituições que lidam com desenvolvimento podem gerar ambiguidades nas estratégias e questionamentos sobre foco e escopo de atuação. Numa tentativa de mapear a evolução histórica do tema, o Banco Mundial criou o documento “World Development Report” e a Organização das Nações Unidas organizou as múltiplas facetas do desenvolvimento por meio dos objetivos do milênio que atualmente são conhecidos como Objetivos Desenvolvimento Sustentável (ODS). No Brasil, o BNDES nasceu, a partir de um Estado forte promotor da industrialização e, ao longo de sua história, incorporou diferentes missões ligadas ao projeto de desenvolvimento do país.

A implantação da metodologia Tiip de avaliação de projetos juntamente com o Quadro de Resultados esperados de um projeto é um esforço para tornar operacional a busca pelas diferentes missões e fortalecer um conceito multidimensional acerca do desenvolvimento, aplicando-o à análise de projetos no BNDES.

A Tiip segue o conceito de “tese de impacto” da J.P. Morgan. Este conceito é utilizado em fundos de impacto social para melhor orientar as decisões de investimento, conforme estratégia pré-definida de atuação para a transformação social. Considera-se uma “tese” por criar uma hipótese a ser acompanhada e verificada durante a execução de cada investimento.

Para a realidade do BNDES, considera-se que cada projeto deve ter sua “tese de impacto” (no caso, a Tiip), que tenha como referência a estratégia corporativa da instituição e que seja acompanhada durante a execução do investimento por meio do sistema de Monitoramento e Avaliação de Impacto do (M&A). O Sistema de M&A é aquele que, a partir dos resultados esperados de cada operação, identifica os indicadores a serem monitorados durante e após a conclusão do processo para verificar se o projeto foi efetivo na entrega do que propunha. Isto é, na medida em que uma variável é considerada benefício relevante do projeto via Tiip, indicadores de M&A podem ser selecionados e monitorados durante a execução do projeto. O escopo de avaliação das cinco dimensões da Tiip, bem como os critérios que as compõem, podem ser encontradas aqui.

Tese de Impacto de Investimento em Projetos (Tiip)
Crédito: BNDES

Essa avaliação complexa e multivariada é sintetizada em uma ilustração de fácil visualização e compreensão. Eis aqui outra característica da Tiip: sua comunicação direta e intuitiva busca atender ao duplo propósito de auxiliar os gestores na tomada de decisão e, ao mesmo tempo, responder à legítima demanda da sociedade por acompanhar os resultados da aplicação de seus recursos.

Helena Tenório Veiga de Almeida é economista do BNDES e atual superintendente da Área de Comunicação e Relacionamento Institucional e João Paulo Carneiro de Holanda Braga é economista do BNDES.

Helena e João Paulo foram responsáveis pela idealização e implementação da Metodologia de Avaliação de Empresas baseada em intagíveis (MAE) e da Tese de Impacto de Investimento em Projeto (TIIP).

Fonte: Agência BNDES