Boston (EUA): dinamismo e planejamento inspiram transformação digital

Universidades de ponta, infraestrutura e planejamento urbano fazem da cidade do estado de Massachusetts uma liderança nos processos de inovação. Por Mariana Castro Alves

MIT é um dos expoentes do ecossistema de inovação de Boston. Crédito: Jake Belcher/MIT

Com um legado cultural, histórico e educacional expressivo, Boston é uma das cidades mais cosmopolitas dos Estados Unidos. Fundada em 1630 pelos ingleses, o grande centro industrial, hoje com cerca de 5,8 milhões de habitantes, desponta entre as maiores aglomerações onde conhecimento e  inovação se aliam para a construção de novas maneiras de apreender e gerir a vida urbana.

É lá que estão a Universidade de Harvard e o MIT (Massachusetts Institute of Technology), em Cambridge, que fica a cerca de 20 minutos do centro, além de mais de 50 instituições de ensino superior como a Tufts University, Northeastern University, Boston University etc. A dinâmica do conhecimento é conectada a uma rede de empreendedores, onde as políticas urbanas são orientadas para a inovação.

Distritos de inovação – O “Kendall Square”, área vizinha a Cambridge (que fica na região metropolitana de Boston) é um exemplo de onde conhecimento e inovação são articulados na transformação digital. Na década de 1950, o MIT começa a implantar parcerias com empresas privadas cedendo parte de suas terras para o desenvolvimento dessas atividades, o que gera, nas décadas seguintes, a atração de empresas, na sua maioria farmacêuticas e da área das ciências biológicas, a se agrupar em seu entorno. Atualmente, entre os escritórios da Google, Microsoft, Novartis e Biogen, está, por exemplo, o do Cambridge Innovation Center (CIC), que hoje abriga mais de 600 startups.

Já o “Boston Innovation District”, localizado ao sul da cidade (“South Boston”), é uma área portuária restaurada para ser um centro de inovação. A partir de 2010, quando o então prefeito de Boston, Thomas Menino, anuncia sua instalação, o “Innovation District” estimula o desenvolvimento econômico da cidade, tendo, desde então, criado mais de 200 novas empresas.

Planejamento urbano – Com um elevado número de grandes empresas (na sua maioria, de semicondutores, biotecnologia, TIC na área de saúde) e startups, impulsionadas por políticas públicas, Boston conta com uma agência de planejamento e desenvolvimento (Boston Planning & Development Agency – BPDA) que integra economia à vida urbana.

Essa agência é composta por 200 profissionais que atendem a cidade de variadas maneiras, desde arquitetos, que revisam os mínimos detalhes de um edifício histórico em Roxbury, a gerentes de projeto, que organizam uma reunião da comunidade para um novo projeto de moradia acessível em Dorchester.

À agência cabe analisar a base tributária pela melhoria dos serviços, incentivar programas de qualificação profissional, incentivar a instalação de novos negócios e a expansão de empresas já existentes na cidade, planejar o futuro dos bairros com a comunidade e identificar limites de altura e densidade dos prédios urbanos, defendendo o transporte multimodal e o desenvolvimento sustentável.

Cidade programável – As latas de lixo de muitos distritos comerciais de Boston já são “inteligentes”, ou seja, mostram quando estão cheias. Os bancos, que servem para a população se sentar, também são providos de terminais de carregamento de baterias. O programa de internet gratuita é distribuído pela cidade em, ao menos, 130 pontos.

A sistematização de informações contínuas e em tempo real (cidades programáveis) tem sido objeto de planejamento urbano. Um plano formulado por mais de 15 mil residentes, o “Imagine Boston 2030”, prevê a melhoria da cidade por meio da coleta e disponibilização de informações, com segurança e privacidade. Hoje, com redes de informações cobrindo todo o espaço urbano, iniciativas como o “Senseable City Lab”, do MIT, buscam desenvolver e empregar novas ferramentas para a apreensão das informações em auxílio das cidades em seus mais diversos serviços.

Embora Boston tenha uma rede turbinada pela integração de empresas, universidades e planejamento público integrado à cidade, mais de 20% de seus moradores não têm acesso à banda larga em suas casas. Por isso, a “equidade digital” é ainda meta para a transformação digital.

Externalidades positivas – Os fatores que fazem Boston figurar como experiência internacional de sucesso têm naturezas diversas. Segundo estudo coordenado por Maria Luisa Campos Machado Leal, com financiamento do BID, Boston apresenta “externalidades perrouxianas; marshallianas; schumpeterianas; castellianas; jacobianas e institucionais”. Assim, o estudo aponta que o ambiente de Boston e Cambridge é propício para a transformação digital, conforme a literatura econômica.

O transporte, a mobilidade e a conectividade, ou seja, a infraestrutura necessária para a constituição de uma economia de mercado, aspectos destacados pelo economista francês François Perroux (1903-1987), são uma dessas condições presentes na região.

O adensamento das atividades econômicas locais, necessário segundo o economista neoclássico inglês Alfred Marshall (1842–1924), também faz parte da metrópole, assim como o ambiente inovador, ao qual dedicou atenção o austríaco Joseph Schumpeter (1883-1950). A relevância das redes, destacadas pelo sociólogo espanhol Manuel Castells (1942), apresenta-se em desenvolvimentos científicos e empresariais, que visam a equidade digital, isto é, garantia de acesso, e uso de sensores para apreensão de informações da cidade em tempo real. Já as externalidades jacobianas, relativas à ativista norte-americana Jane Jacobs (1916-2006), estão as vantagem de ação coletiva da cidade, de sua inventividade e criatividade. Algo propiciado pela riqueza histórica da urbe, com sua diversidade econômica e cultural, de olho no futuro.

Por Mariana Castro Alves